A regra constitucional prevista no § 5º, do art. 37, da Constituição Federal de 1988 é pela prescritibilidade dos ilícitos praticados pelos agentes públicos, sendo a imprescritibilidade, portanto, a exceção.
E isto porque, conforme bem nos leciona Mauro Roberto Gomes de Mattos: “O tempo funciona como senhor da razão, cicatrizando chagas de injustiças, ou curando atos defeituosos, que passam por um período de maturação até que se tornem inatingíveis” (in MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. Lei no 8.112/90 Interpretada e Comentada… Op. cit. ant., 2. ed. p. 818).
A propósito da prescrição disciplinar, estabelece o § 1º, do artigo 142, da Lei n. 8.112/90 que o dies a quo da prescrição é a data em que o fato foi conhecido pela Administração Pública (lato sensu). Ou seja, qualquer ilicitude comunicada ou descoberta pela Administração Pública em geral seria o suficiente para iniciar-se o lapso prescricional, pois a lei não faz distinção do “tipo” da Administração que toma conhecimento do fato (se é a autoridade máxima do órgão, se é o diretor-geral, ou quem quer que seja).
Em assim sendo, a jurisprudência até então vigente sobre o tema, notadamente o Supremo Tribunal Federal, anotava que: “(…). de acordo com o art. 142. inciso I, § I, da Lei n° 8.112/90, o prazo prescricional de cinco anos, para a ação disciplinar tendente à demissão ou cassação de aposentadoria do servidor, começa a correr da data em que a Administração toma conhecimento do fato àquele imputado (…).” (in Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n. 24.737-5/DF, publicado no DJU de 3 de setembro de 2004). A própria Advocacia-Geral da União exarou Parecer Vinculante para toda a Administração Pública nesse mesmo sentido, a teor da NOTA DECOR/CGU/AGU N. 208/2009-NMS.
Todavia, o Superior Tribunal de Justiça, com o propósito de uniformizar a sua jurisprudência, exarou a Súmula n. 635, no seguinte sentido: “os prazos prescricionais previstos no artigo 142 da Lei 8.112/1990 iniciam-se na data em que a autoridade competente para a abertura do procedimento administrativo toma conhecimento do fato, interrompem-se com o primeiro ato de instauração válido – sindicância de caráter punitivo ou processo disciplinar – e voltam a fluir por inteiro, após decorridos 140 dias desde a interrupção.”
Essa interpretação elastece ainda mais o prazo prescricional disciplinar já por demais benéfico à Administração, porquanto confere o dies a quo da prescrição apenas à data em que a autoridade competente toma conhecimento do fato, ou seja, o dia em que a autoridade com poderes específicos para deflagrar procedimento correicional (Corregedor-Geral do órgão) recebe a notícia de fato é que dá início ao prazo prescricional.
Além do mais, essa interpretação facilita a adoção pela Administração de práticas desleais e ardilosas, no sentido de manipular ou maquiar as datas em que os fatos se tornaram conhecidos, com o fim de elastecer ainda mais o prazo prescricional e encobrir a sua própria inércia.
A meu ver, a edição da Súmula n. 635, do e. Superior Tribunal de Justiça, é um retrocesso jurisprudencial, que torna o servidor público ainda mais suscetível de ser atingido por um processo disciplinar, muita das vezes fruto de desvirtuados interesses.